27 de julho de 2012

"Vida no Campo" - Álvaro Domingues faz o funeral da ruralidade

Abel Coentrão
11.01.2012
Álvaro Domingues já nos tinha dado, há dois anos, "A Rua da Estrada", viagem pelo urbanismo das bermas, pela cidade que, para lá da redutora dicotomia centro/periféria, se espraia por vias nacionais afora, exibindo a quem passa uma estranha e muito própria maneira de ocupar o território.

Esse foi o primeiro livro de uma trilogia do geógrafo Álvaro Domingues, que há-de acabar, em 2013, com uma outra viagem a que já deu o nome de "Volta a Portugal". Antes desse terceiro volume inspirado na famosa prova de ciclismo, o docente da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto deixou-se perder pela "Vida no Campo". Trata-se de um daqueles títulos enganadores, a puxar pelo bucolismo, coisa que, em Álvaro Domingues, esbarra na esquina de um qualquer parágrafo de prosa, sem direito a piquenique ou fedor a bosta. O mundo rural é uma saudade, e "a questão é que o luto, enquanto processo de esquecimento, é constantemente perturbado pela presença do morto", ler-se-á a dado momento. Mas nada de chorá-lo, que Domingues faz este funeral à moda antiga, com foto do cadáver em urna e tudo. Coisa normal num observador que anda sempre de máquina em "stand-by", apanhando o país de calças na mão, nas poses mais inesperadas, e legando, em cada obra que escreve, imagens que, por vezes, quase dispensariam palavras. Algumas são de fazer chorar, outras impelem-nos a rir, para disfarçar as lágrimas que lavariam este nosso "mau viver pelo abandono e despovoamento" de uma boa parte de Portugal.
in:
http://ipsilon.publico.pt/livros/texto.aspx?id=299040

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