4 de novembro de 2014
SERÁ QUE PRECISAMOS DA PARTICIPAÇÃO DOS ACTORES NO PLANEAMENTO DO TERRITÓRIO?
Encontro Anual da AD URBEM 2014
“A política de ordenamento do território e urbanismo e a nova arquitectura da nossa administração territorial”
PAINEL 1 | A POLÍTICA DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E URBANISMO
Resumo da comunicação de:
José Carlos Mota
Departamento de Ciências Sociais, Políticas e do Território, Universidade de Aveiro
A temática da participação em questões de interesse colectivo e relacionada com o planeamento do território tem sido uma matéria com crescente interesse na agenda política, cívica e mediática, sobretudo pelo contexto de crescente descontentamento e desencanto com o exercício da democracia.
Acontece que a prática revela que, em processos de participação, muitos dos objectivos bondosos não são tidos em conta ou não são convenientemente considerados, gerando situações de ampla crítica. A revisão da literatura e análise de um conjunto de casos de estudo permitiu identificar um conjunto de críticas à participação dos actores em planeamento do território, estes entendidos como conjuntos de indivíduos com um número significativo de características comuns (interesses/motivações e meios), que desempenham um qualquer papel num determinado palco, influenciando ou sendo influenciado por outros actores e que podem possuir um projecto colectivo.
A primeira tem a ver com a natureza complexa dos problemas - os “wicked problems” referidos por Rittel (1973) - a que o planeamento do território tem de responder, o que gera, normalmente, situações de conflito, distanciamento dos actores menos habilitados e dificuldades de entendimento e implementação.
Para além disso, as críticas centram-se também na importância concedida ao aparato participativo, fortemente mediatizado, criando muitas vezes uma ilusão de elevada democraticidade, frequentemente sem o adequado apetrechamento de conhecimento técnico e científico sobre o objecto em discussão.
A forma como os diferentes actores controlam o palco da participação e os seus resultados pode conduzir a processos pouco transparentes que induzam a manipulação dos interesses dos actores mais fracos e a legitimação dos interesses dominantes, muitas vezes apresentados em nome do «interesse colectivo». Esta circunstância ocorre não só pelo desempenho dos actores com mais meios e motivações, mas também pela incapacidade do promotor do planeamento do território em coordenador o processo participativo, em atender aos actores em presença, em preparar e adequar os conteúdos em discussão ao contexto onde se insere e em apoiar os actores com mais dificuldades de acesso aos diferentes palcos participativos (Day, 1997).
O momento e o método usados para promover a participação também têm levantado muitas dúvidas, pelo facto de ocorrerem, muitas vezes, de forma burocrática, pontual e fragmentada, ou por serem desenvolvidos em formato top-down, com enfoque temporal nas fases finais dos processos, quando as principais decisões e seu quadro de suporte estão já definidos, por isso com limitado impacto potencial nas decisões.
Por último, são referenciados os elevados custos do processo (tempo, dinheiro e políticos), muitas vezes associados a processos mal conduzidos (Day, 1997 e Irvin & Strasburry, 2004), e a falta de avaliação dos resultados da participação (Agger, 2008: 154) e dos impactos que geram no exercício de planeamento.
Perante este conjunto de críticas, coloca-se a questão da pertinência e necessidade de considerar a participação em planeamento do território, sobretudo no quadro dos desafios que se colocam hoje à sociedade contemporânea. O presente artigo, realizado com base em investigação produzida recentemente no âmbito da tese doutoral «Planeamento do Território: Método, Actores e Participação» (Mota, 2014), irá defender a necessidade de equacionar a participação numa diferente abordagem metodológica de planeamento, num novo conjunto objectivos e de actores a envolver.
A participação deverá assim procurar contribuir para aumentar a democraticidade do planeamento do território induzindo um aumento de transparência, uma maior abertura à participação de todos os actores interessados e o acesso público aos seus conteúdos, metodologia e resultados. Esta abertura pode promover uma maior responsabilização de todos os actores envolvidos pela condução e produtos obtidos, tornando o exercício mais justo e menos vulnerável aos actores mais poderosos. Com esta prática, o promotor é incentivado a prestar contas pelas opções tomadas, reforçando com isso a sua legitimidade.
Para além disso, a participação poderá, também, contribuir para aumentar a capacitação dos actores, ao procurar organizar-se um conjunto de iniciativas que os dote com mais conhecimento sobre o objecto de planeamento, o seu contexto, a realidade dos restantes actores na sua diversidade de motivações e meios. Poderá, assim, ser mais fácil gerar uma melhor percepção das questões que determinam o interesse colectivo, conseguindo minimizar a relevância e destaque dos interesses particulares e perceber melhor a necessidade de equilibrar os vários interesses em presença. Esta melhor partilha e compreensão poderá ajudar a criar um contexto de maior resiliência face às dificuldades que favoreça, potencie e mobilize a acção colectiva.
Por último, a participação tenderá a contribuir para aumentar a eficácia do planeamento do território, se isso se traduzir numa maior valorização, mobilização e alinhamento dos meios e motivações dos actores em torno dos objectivos colectivos, assegurando um melhor conhecimento pelos actores do objecto de planeamento, conseguindo identificar-se recursos e actores que até à data não eram conhecidos ou devidamente valorizados, permitindo perspectivar a sua utilização e criar compromissos que viabilizem a acção em torno do interesse colectivo.
(*) abstract resulta da investigação produzida na tese de
doutoramento
«Planeamento do Território: Método, Actores e Participação»
orientada pelo Prof. Doutor Jorge Carvalho
Ver:
http://www.adurbem.pt/images/stories/ficheiros/Encontro_2014/resumos_encontro_2014_ad_urbem.pdf
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