Como nos diz Fernando Pessoa
“(…) a cidade é igual a qualquer outra, também é simultaneamente diversa de qualquer outra, pela simples razão que ela é também uma abstracção, uma metáfora vivente, que pode ser descrita e apreciada através de infinitos modos e representações.”
Encarando a citação de Pessoa em jeito de premissa, contextualizemos.
O conceito de cidade não apresenta um padrão universal, é variável de nação para nação e mutável de acordo com uma panóplia de sinergias complexas e correlacionadas que compõem e encerram a realidade da própria urbe.
No fundo, a cidade é um espaço de socialização, de intervenção humana, contém o ícone da guarida histórica, de todo o processo construtivo de diferentes (co)rrelações a diferentes escalas, proporcionado por gerações anónimas que se espelham muitas das vezes de forma abstracta, tal como nos disse Hideinburgo.
Mas, esta cidade é quase como uma espécie em extinção.
Temos a noção de que a cidade e o indivíduo se diluem em infinitos modos de representações, com uma influência cada vez mais global e onde a ocupação do “espaço” já não é só física, mas também virtual.
Temos, também, a noção de que esta nova cidade virtual acaba por não carecer da presença física do homem, mas, e tal como nos disse Corbusier_”a primeira prova de existência é ocupar o espaço”!....
Esta virtualidade (se assim se pode dizer) retira às cidades uma das suas principais funções, a de serem contempladas/apreciadas, percorridas a pé. É esta forma de usufruto que nos apoia a reflectir sobre a nossa realidade interior e a nos identificarmos com a exterior, a confraternizar com o transeunte que por nós passa/acompanha e envolve.
É esta relação biunívoca homem/cidade que nos permite acarinhar/identificar com determinado espaço/lugar.
Fazendo uma brevíssima retrospectiva, poderemos dizer que passámos por uma cronologia que seguiu um percurso orgânico, simbólico, místico, para dar lugar a uma realidade rectilínea dura, racional, quase que roçando a esterilidade emocional.
Encontramo-nos, agora, numa cidade onde surgem espaços/lugares descaracterizados, onde se destoem abruptamente memórias e se constroem emaranhados de redes que nos desenraízam e desorientam, eliminando a usufruível desejável liberdade amena, o normal fluir de todo o processo civilizacional.
Ou seja, o crescimento das cidades foi ao longo dos tempos sujeito a diferentes concepções, umas planeadas, outras com vista a dar resposta a problemas urgentes, tais como a ausência de higiene/salubridade ora causada por pestes, ora por êxodos e (e)imigrações populacionais, ora por guerras.
Muitas dos modelos planeados pecaram por demasiado idealismo, e muitas das concepções imediatas pecaram pela ausência dele. As respostas urgentes castraram toda e qualquer simbologia inerente a todos nós, que nos preenche como seres humanos.
Ironicamente, verificamos que a presença de um pragmatismo exagerado devido à presença excessiva de normas, regras, imposições, onde o mundo das ciências exactas e dos chavões se reproduzem de forma impar e a um ritmo mutacional desconhecido, acaba por andar pelo patamar da utopia, por inaplicabilidade das mesmas!
Por sua vez, a presença de um lirismo exagerado, que se mistura com o mundo das ciências subjectivas, sociológicas, psicológicas, acaba por não nos deixar “espaço” para uma intervenção oportuna e atempada!
Esta clivagem entre processos de concepção das cidades ora demasiado pragmáticos, ora demasiado utópicos, não tem conseguido dar resposta às reais necessidades do indivíduo e esta nossa cidade global, ainda não encontrou o seu lugar na história, a sua identidade, porque ainda embrionária.
Portanto, para evitar a reprodução de erros passados, urge um novo “olhar concepcional”, mais colorido de humano, menos cinzento de betão, associado a todas as nossas naturais formas de encarar as matizes psico-emocionais!
Um olhar que apoie à estruturação da cidade/individuo, à confortável orientação, à (re)descoberta do nosso quadro de referências internas!
Um Volver estético-emocional a percorrer por um processo de aculturação que exija, não só o continuum naturale, mas também um continuum individual e social!...
Cristina Montez
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário